03/03/14

HISTÓRIA DOS "ILUMINADOS" (III)

(continuação da II parte)

Apenas havia dois anos que Weishaupt consagrava ao seu Iluminismo esta tenebrosa escola, quando já seus discípulos, dignos de seus projectos, propagavam suas conspirações por outros subterrâneos. Para julgar a importância dos meios pelos sucessos, façamos uma pequena meditação sobre o que ele diz na carta seguinte [a Areopagitas, Catão e Mario]:

"Para o futuro tratareis de outra maneira com Timon e Hohenheicher. Eu lhe revelei todo o segredo, e me mostrei, como fundador da nossa Ordem; e isto fiz por muitas razões.
I. Porque é necessário que eles sejam fundadores de uma nova colónia em Freysinga, sua pátria; e por este motivo é bom aproveitar-me do tempo que estão em minha casa, dando-lhes lições mais particulares de nosso sistema, e sua marcha; o que seria perigoso e dilatado por via dos correios.
II. Porque é necessário que eles me adquiram o Barão de E... e alguns outros de seus colegas, de muita utilidade para os nossos últimos fins.
III. Porque Hohenheicher, conhecendo meu modo de pensar, cedo ou tarde adivinharia, que o Iluminismo era obra minha.
IV. Porque de todos os meus académicos do ano passado, ele era o único, a quem nada se tinha revelado.
V. Porque se ofereceu de contribuir para a nossa biblioteca secreta de Munich, e de nos dar diversas relações muito importantes do Capítulo de Freysinga.
Finalmente, depois de os intruir, os três meses que faltam, um e outro ficarão em estado de nos fazer grandes serviços." (Escript. orig. t. I. Cart. 12 a Catão e a Mar)

Desta carta segue-se com evidência, 1º que de todos os pensionistas de Weishaupt desde o primeiro ano de sua conspiração, nem um só escapou ao seu laço; 2º que antes de lhe ter dado suas últimas lições, servia-se deles para alistarem o resto dos académicos, que não pôde atrair ao seu colégio; 3º que o momento, em que os mandava a seus parentes, como tendo acabado o estudo das leis da pátria; eles os enviavam munidos de todos os princípios, e de todos os artifícios de sua conspiração contra estas mesmas leis, contra a sociedade, contra a Religião, e contra toda a propriedade.

Os adeptos de Munich seguiam tão fielmente suas lições, e seus exemplos em propagar a Ordem, que Weishaupt, comparando seus sucessos, não hesitava em falar desta sorte: "Se vós continuais com o mesmo zelo, em pouco tempo seremos senhores de nossa pátria, isto é, de toda a Baviera" (Escript. orig. t. I. Cart. 26).

Como suas visitas não se limitavam somente ao eleitorado, ele mandava aos seus aeropagistas, que alistassem entre os estrangeiros, que habitavam em Munich, algum mais apto a receber instruções, a sim de ir plantar colónias em Ausburg, Ratisbona, Saltzburg, Landsbur, e em Francónia. Ainda em Ingolsadt nada se suspeitava; quando já Baviera contava cinco lojas em Munich; outras lojas, e outras colónias estabelecidas em Freysinga, Landsberg, Burghausen, Straubing, começando-se outras em Ratisbona, e Viena. Seus apóstolos corriam de um e outro lado; e semelhante à peste, tinham já inficcionado o Tirol, Milão, Holanda, e Francónia. Aos três anos da fundação do Iluminismo, já se contavam para mais de mil iniciados (cart. 25 a Catão 13 de Novembro de 1778).

A multiplicidade e a variedade de figuras, que Weishaupt fazia em Ingolstadt para conseguir seus fins, não é fácil explicá-las; pois só a pequena ideia, ou o esboço, que de si faz, quando se propõe por modelo em suas cartas a Catão; é que nos pode fazer acreditar tanta hipocrisia:

"Fazei como eu, apartai-vos das grandes companhias. - Mas esperai só, a hora virá em que tereis muito a faer. Lembrai-vos de Sejano, que parecia nada fazer, e que debaixo de uma aparente indolência fazia muitas coisas. Erat autem Sejanus otiso simillimus, nihil agendo multa agens."

Não houve no mundo um conspirador, que mais fielmente desse o preceito e o exemplo. Porém a pezar disto, Weishaupt devia também huma parte de seus sucessos ao zelo e à actividade, que sabia inspirar a seus adeptos.

O mais notável deles, era sem dúvida Xavier Zwack, a quem chamava o adepto incomparável. Ele foi sempre o adepto íntimo, a quem se dirigiam a maior parte das cartas, que se acham impressas debaixo do título de Escriptos Originais; e a quem o fundador dizia:

"Vós só me tendes superior, porque estais elevado sobre todos os irmãos. Um vasto campo se abre ao vosso poder, e à vossa influência, se acaso nossos sistemas se propagam". (Cart. 27, t. I)

Xaver von Zwack
 Tantos favores e distinções supõem bastantes títulos. Para apreciar os deste adepto favorito, bastará lançar os olhos sobre o extracto que dele faz o irmão alistador, anunciando a Weishaupt a conquista, que tinha feito. Conforme este extracto; Xavier Zwack, filho de um comissário, nasceu em Ratisbona. Foi iniciado a 29 de Maio de 1776, tendo 20 anos de idade. Nesta idade, "sua altura era de cinco pés [pouco mais de 1,50m], todo o seu corpo defecado pelo deboxe de um temperamente melancólico. Seus olhos fracos e languidos, sua tez pálida; olhando de contínuo para a terra. Seu caracter moral é pintado nestes termos: Coração sensível, e em extremo filantrópico; Estoico nos acessos da melancolia. Amigo do verdadeito, circunspecto, etremamente amador do segredo. Falando muito de si, invejoso das perfeições dos outros; voluptuoso. Incapaz para as grandes sociedades; colérico e arrebatado; fácil em moderar-se- Dizendo voluntariamente suas opiniões, e quando as louvam, ele as contradiz. Sua religião, e sua consciência é afastada da opinião comum, isto é, pensa da maneira que a Ordem manda aos seus adeptos. Possui no maior grau a arte de se contrafazer, e dissimular. Cioso em conhecer os homens."

Este retrato do adepto favorito de Weishaupt pode reduzir-se a estes termos: deboche imoderado, grande orgulho, amor próprio e fatualidade; inveja, dissimulação, e negra melancolia. Zwack era como Weishaupt, um ateu com todos os dotes característicos dos conjurados revolucionários. isto bastava para o banir das sociedades honestas: era um desses filantropos, que dizem amar o género humano, para arruinar as leis que o governa, e o autor que as deu. Tais são os vícios, que a seita indagava, e procura achar em seus alunos, e que fez de Xavier Zwack o Catão de Weishaupt. (Tais os vícios de todos esses, que no meio de nossos século se dizem ilustradores do género humano, e que debaixo do nome de amigos da humanidade, a nada poupam para quebrantar o freio dos malvados, a segurança dos bons; para, digo, destruir todos os códigos, que governam as nações civilizadas, substituindo-lhe as leis das paixões mais baixas, e avaliando desta maneira a natureza humana.)

Apesar disto por pouco que as lições do irmão alistador iam privando o Iluminismo dos grandes serviços, que tinha a esperar do novo Catão. Apenas soube que a morte para o sábio só devia se um sono eterno, embriagado deste princípio, e aborrecido de sua existência; ele se persuade que morrer por suas próprias mãos, era morrer como grande filósofo, e por este motivo dava parte a seu irmão alistador, dizendo-lhe a resolução que tinha tomado:

"... amigo eu tomei o melhor partido. Não duvides de minha probidade, nem deixes duvidar a Ordem; confirma os sábios nos juízos, que fizerem da minha morte; chora com piedade os que me incriminarem, pois que ainda vivem no erro. Tuas lágrimas a meu respeito injuriaram minha memória, teus princípios, e o resto dos irmãos."

Uma carta do mesmo género escreveu também de sua mão, convidando os irmãos a honrar suas cinzas, e abençoá-las, em quanto a superstição as amaldiçoasse:

"às bordas da minha sepultura, continuava o moderno Catão, eu desço com reflexão, pois tenho escolhido a morte por conversão, por demonstração, como a minha felicidade."

Não se sabe o que persuadiu a este mancebo insensato esta espécie de felicidade; com tudo Zwack escolheu viver, e hoje continuando a propagar as conspirações da seita, achou seu protector no Sereníssimo Príncipe de Salmkirbourg. Seus pensamentos sobre o suicídio tiveram todo o efeito na sua cunhada. Ela procurou a morte como filósofa; e aprveitando-se das lições de Catão, precipitou-se do alto de uma torre. Catão Zwack preferindo a vida à morte, veio a ser Conselheiro íntimo da Côrte da Baviera com vinte mil florins anuais; e o primeiro Conselheiro de Weishaupt em seu aerópago; grande director de todas as conspirações da seita, contra todos os soberanos e suas Côrtes.

(continuação, IV parte)

Sem comentários:

TEXTOS ANTERIORES