18/01/15

HARMONIA POLÍTICA DOS DOCUMENTOS DIVINOS (IV)

(continuação da III parte)

CONSEQUÊNCIAS
Por Razão

10. De se conhecer no Príncipe recto propósito, lhe resulta ser bem servido. É grande segredo de estado interessar Deus nos desenhos; porque o povo os julga por justos, e lhes prognostica bom sucesso; e sendo certo que todas as acções se encaminham ao fim, é infalível que ele [tal fim] as anima; se o [fim] do Príncipe é uma empresa gloriosa, faz-se apetecer, e assim em nada reparam os Vassalos, por terem parte em se alcançar;  , uma vaidade, uma injustiça; a natureza o aborrece; e assim não pode haver obediência que se delibere em trabalhar, e arriscar por um fim em que não se há-de ganhar senão vitupério. Os Vassalos são víctimas do Príncipe, mas voluntárias e racionais que se deixam sacrificar a ídolos. O povo nunca olha tão puramente ao merecimento do Príncipe, que não busque também nele sua utilidade; cada um julga das acções alheias conforme ao interesse próprio; de modo que a obrigação de obedecer se regula pela glória de ser mandado; até os preceitos rigorosos se avaliam pela recta intenção, levando-se voluntariamente como medicinas amargosas.

11. Em ordem àqueles fins que notamos nos Sereníssimos Reis de Portugal, os Vassalos se arriscavam em batalhas desiguais, em navegações temerárias, em façanhas prodigiosas com a extraordinária obediência que celebra o grande Camões; sendo muito para advertir os que mostraram mais zelo de propagar a fé e fundar templos, D. Afonso Henriques e D. Manuel, foram os melhor servidos; pois para o primeiro ganharam os Vassalos a maior parte de Portugal, e para o segundo quase todas as conquistas; à vista da glória que se alcançava, ninguém duvidava obedecer e servir; todos afectavam participar da honra à custa das fazendas, e das vidas. Desejos que se foram acabando ao passo que se mudou a intenção; porque os bons se abstinham de cooperar no mal, os maus se resolviam em pecar antes por amor de si; deste modo qualquer preceito parecia duro, não tinha execução, porque não achava obediência, sendo notório a todos o que a Política Divina diz pelo Eclesiástico: "Toda a má obra em fim faltará, e quem a faz perecerá juntamente; toda a boa obra se justificará, e quem a faz tirará honra dela."

SENHOR

12. A prova mais ilustre da recta intenção dos Senhores Reis de Portugal são suas conquistas. Ao grande Rei D. João II representaram alguns maus políticos despesas, e outros inconvenientes que se seguiram do descobrimento da Índia; mas desprezou todos por dilatar a Fé. Cristo Senhor nosso enfeudou este Reino ao Santo D. Afonso Henriques, e a seus descendentes com obrigação expressa de propagarem o Evangelho a gentes estranhas. Deve o Feudatário conforme a direito, satisfazer às obrigações do feudo sob pena de privação. Se alguém com qualquer capa, ressuscitar semelhante conselho com que se largue um plano de conquista a inimigos da Religião Católica, sem urgentíssima, e claríssima necessidade, tenham V. A. R. por ministro Diabólico que o quer fazer cair em comisso; o mal de largar o património da Igreja é certo e de presente: as conveniências de discursos falíveis, tão incertas, e de futuro; Cristo Senhor do feudo (diz S. Agostinho) não há de pedir conta do que sucedeu, mas do que se fez. Finalmente em todas as matérias, as colunas de nossos edifícios, são as virtudes, as bases dessas colunas é a recta intenção; o fim é o que dá ser à obra; o de todas as de V. A. Real seja Deus, lembrando-se que diz a Divina Política pelo Apóstolo, "O fim da lei é Cristo".

(continuação, V parte)

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