20/01/15

HARMONIA POLÍTICA DOS DOCUMENTOS DIVINOS (V)

(continuação da IV parte)

PARTE II
DA JUSTIÇA PARA CONSIGO MESMO

Parágrafo I
Reputação

Segunda parte respeitante à Justiça (que é para consigo mesmo), pede na Política Evangélica que:

"Cada um, além de ser em particular virtuoso, procure ser em público bem reputado; não basta cingir-se interiormente com virtudes, sem trazer nas mãos tochas acesas de boas obras."

1. Porque, sendo o homem nascido para sociedade, se, contentando-se com o testemunho de sua consciência, desprezar o comum, será injusto consigo, privadamente da honra devida ao virtuoso: com o próximo, negando-lhe o bom exemplo: e com a virtude, tirando-lhe o meio de se comunicar. Por isto o homem não é Senhor absoluto, mas dispenseiro fiel da sua Reputação; pois se a quiser estragar pelo que lhe toca, a deve conservar pelo que pertenceu ao público, e à mesma virtude, que da fama receba mais lustre, posto que não recebe mais perfeição; e quando seja Senhor, as leis proíbem usar mal dos bens próprios.

2. A natureza na composição do universo, e do homem, mostrou que esta obrigação é maior nos que têm superior lugar, quando fez os corpos celestes mais claros que os terrestres: o fogo mais puro que os outros elementos: o rosto mais gracioso que todos os membros: os olhos mais resplandecentes que todas as feições; e a razão dita, que sendo o Príncipe um exemplar para os súbditos, como já dissemos, faria mais prejuízo aos próximo, e à virtude, se ele privasse do melhor exemplo, e a ela do mais certo meio de comunicação. Seria um fole que negasse ao mundo a luz que se lhe deu para alumiar; e deve ter o Príncipe maior cuidado de sua fama, porque o resplendor que acompanha sua pessoa, descobre mais seus procedimentos; a terra (dizem os poetas) se fez fecunda de línguas, para publicar o defeito DelRei Midas; qualquer fama que alcance há-de ser grande, não à proporção de sua dignidade, dizendo-se muito mais do que for, ou no bem, ou no mal.

MEIO PARA ALCANÇAR
Boa Reputação

3. A Política Evangélica ensina que para alcançar Reputação boa, são necessárias obras exteriores, quando diz, "Pelos frutos os conhecereis"; porque os homens não podem louvar senão o que estimam, nem podem estimar senão o que conhecem, nem conhecer senão o que se lhes descobre; e a presença das substâncias espirituais não se descobre senão pelos efeitos; a de Deus no mundo, por sua providência: a dos Anjos no lugar, por suas maravilhas: a da alma no corpo, por seus discursos: a da virtude na alma, por suas obras.

4. Nem basta que estas sejam indiferentes; quem não é vicioso deixou um estremo, não chegou ao outro, e assim como não é vituperável, não é louvável; dir-se-há dele, que é mais sem vícios, que com virtudes. O estado dos Príncipes não permite juízo indiferente; ou hão- de ser amados, ou odiados; não são grandes senão para obrarem coisas grandes; sua vida será desprezada, se não for virtuosa; pelo que lhes é necessário fazerem obras tão generosas que seu louvor se não possa dissimular. Epiteto e Agesilão com o lume da razão o alcançaram quando, ainda aos particulares que pretendiam ser bem reputados, aconselhavam que falassem, e obrassem; pois, consistindo o hábito na potência, e a virtude na acção, justamente se julga por morta a virtude que não obra, como o coração que não se move, o fogo que não queima, a árvore que não brota.

5. Não deixo de condenar a ostentação vangloriosa; faz mal quem contenta a fama, e não a consciência, mas advirto que se a providência contra a vaidade chegar a medo (principalmente nos que governam) fera reprovável; cada um evite seu dano, mas satisfaça a sua obrigação; a prudência o conseguirá, não encobrindo, nem descobrindo tudo; Sejam mais as obras boas que as manifestadas, para que nas ocultas se conserve a modéstia, e nas públicas se alimente a fama; neste sentido granjear o Príncipe com honesta diligência bom nome, lhe é tão importante para governar o Estado, como ao sol espalhar sua luz para alumiar o mundo.

6. Assim o fizeram os Sereníssimos Reis de Portugal; porque não só fugiram dos vícios, nem só abraçaram as virtudes, mas também deram disso as demonstrações mais abalizadas, de que estão cheias as histórias. o Excelente Camões advertiu judiciosamente que ElRei D. Sancho Capelo não foi vicioso, antes valoroso defendeu dos Mouros Alcácer, e lhes tomou Mértola, e liberal fez doação desta praça aos Cavaleiros da ordem de Santiago; Só por uma pouca remissão o não puderam sofrer os Portugueses, porque só a reis por eminência virtuosos obedecerem seus ânimos; com o que bem se mostra quais foram seus reis.

(continuação, VI parte)

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