03/02/15

HARMONIA POLÍTICA DOS DOCUMENTOS DIVINOS (VI)

(continuação da V parte)

CONSEQUÊNCIAS
Por Razão

D. João II
7. Da reputação resultam ao Príncipe três consequências importantíssimas:

8. A primeira, que seu exemplo regulará os súbditos; fazendo-os bons, os fará obedientes e fáceis de ser governados, fazendo-os maus mais, dificilmente sofrerão governador; a fama de seu brio lhes infundirá valor, e a de sua fraqueza os fará cobardes.

9. Quem duvida que o exemplo dos Sereníssimos Reis de Portugal doutrinava o povo [população] de quem eram (como dissemos) tão obedecidos? E [quem duvida] que a opinião de seu esforço animava nos seus, os corações galhardos?

10. A segunda, que tal qual for a reputação, tal será a autoridade (como o entenderam bem os Governadores daquela república antiga, os quais não quiseram publicar uma lei boa inventada por um homem suspeito nos costumes, sem lhe darem por autor outro [homem] de rectidão conhecida). A reputação é fundamento da estima, a estima o é da obediência; um Príncipe não pode temer que outrem não é estimado melhor que ele.

11. A boa reputação de nossos Reis lhes reforçava a autoridade com que imperavam tão absolutos, como já notámos; largo seria mostrar isto de cada um em particular, bastará por todos o grande D. João II tão cuidadoso nesta matéria, que andava de noite disfarçado informando-se do que se dizia dele; e como foi o mais solícito de seu crédito, foi o que com a autoridade venceu maiores contradições dos seus, como é notório.

12. A terceira, que conforme à reputação lhe deferiam os estrangeiros; um o fará amado, e temido; outro, odioso, e desprezado; pois como a moeda de ouro ou prata não tem comércio sem marca legítima, o não têm as acções e embaixadas poso que úteis, sem viverem marcadas da boa opinião, avaliam-se como presentes de tímidos, ou de inimigos, que se presumem enganosos, o exterior sempre é suspeitoso, ainda que o interior seja cândido; donde nasce que não se admite a liga do fraco, a oferta do interesseiro, nem a promessa do enganador; e assim é o mesmo desprezar a reputação que destruir os súbditos e arruinar o Estado.

13. A reputação que entre os estrangeiros tinha o excelente Rei D. Dinis (escreve Duarte Nunes) o fazia respeitar em todas as partes: pela que tinha o grande Rei D. João II disse Carlos VIII Rei de França que tendo-o por amigo se atreveria contra o mundo todo.

14. Não é minha intenção negar que a verdade pode mais que tudo, mas digo que a opinião vestida de suas cores lhe usurpa o Império colocando seu trono nos espíritos dos homens, de que perde a posse dificilmente; dali governa sem contradição, levanta e abaixa a seu alvedrio, põem o preço a todas as coisas; de modo que as de muito valor pouco se não levam o seu selo; por isso costuma ser tão poderosa nas ocorrências morais, que só com ela se livra um réu acusado de grandes indícios de delito; só com ela a presença de um républico aplaca um povo amotinado: só com ela a voz de um General repara um exército perdido; que muito? Se estende seu poder às matérias naturais, pois a opinião que o enfermo tem da ciência do médico, lhe aproveita algumas vezes tanto como a bondade dos remédios; a exemplo da imaginação, cuja força produz monstros em partos prodigiosos, quase zombando da natureza; Divinamente considerou tudo a Divina Política pelo Sábio quando disse: "Melhor é bom nome que muitas riquezas".

(continuação, VII parte)

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