04/02/15

"PORTUGAL EM ROMA" - O REI NO EXÍLIO (III)

(continuação da II parte)

Depois que D. Miguel regressou de Génova, foi a Pádua, partindo na tarde de 11 de Outubro, levando em sua companhia D. Bernardo de Almada e Pinetti, dentro do carro, e na almofada e traseira três criados. No segundo carro ia o Marquês de Lavradio e Guião, e todo o resto da Família de Sua Altesa ficou em Roma. Mas às portas da cidade Guião e Almada desceram e ficaram em Roma.

Roma
A propósito de D. Bernardo de Almada, camarista dedicadíssimo de D. Miguel, direi que no dia 8 de Maio de 1839 foi vítima de uma grande desgraça que o matou. Não se sabe como isto se passou, havendo-se ele separado naquele dia das outras pessoas com as quais tinha ido à caça das codornizes, e continuando só neste divertimento enquanto os companheiros voltavam para casa em Porto d'Anzio. Foi encontrado pelo boticário daquele lugar que também andava à caça e ao qual D. Bernardo pediu àgua para beber, e não a trazendo ele consigo lhe indicou a fonte que se achava a pequena distância, e para ali D. Bernardo se dirigiu. Passados coisa de dez minutos ouviu o boticário um tiro de espingarda que supoz dirigido por D. Bernardo contra alguma condorniz, e portanto não fez disto o menor caso, e de nenhum modo lhe veio ao pensamento o infortúnio acontecimento provavelmente aquele momento.

Não comparecendo porém D. Bernardo à ceia do dia 28 nem ao almoço do dia seguinte, um dos criados de D. Miguel, o cozinheiro, foi pelas casas que D. Bernardo frequentava em Porto d'Anzio procurar notícias dele, e encontrando o boticário este lhe referiu o que entre ambos se havia passado na precedente tarde, e também lhe falou no tiro que havia ouvido e do juízo que então fizera. o cozinheiro dirigiu-se ao sítio indicado, e ali encontrou D. Bernardo estendido por terra, e o cão deitado ao seu lado. Quis aproximar-se, mas o cão não o permitiu. Voltou a Porto d'Anzio e em companhia de outros criados e pessoas de lugar, entre as quais a autoridade civil do distrito, partiu sem demora para tomar conhecimento do triste facto, e acharam que morrera de um tiro de chumbo que lhe entrara pela parte inferior do queixo do lado direito e caiu pelo alto da cabeça; julgando-se que o tiro fôra da sua própria espingarda pois que se observou que um dos canos desta estava descarregado e armado o cão. Supõem-se que antes ou depois de beber água na própria fonte, o cão de caça que D. Bernardo muito estimava, festejando o seu dono e provavelmente levantando-se para subir por ele acima, como costumam os cães em tais circunstâncias no acto de voltar à sua natural posição, tocaria com uma das patas no gatilho, e fez disparar a espingarda, ainda que custa a conceber a reunião das circunstâncias para que um tiro disparado assim pudesse tomar a direcção observada, que mais parece dada de propósito que acidental.

Uma das coisas que mui preocupou o Marquês de Lavradio foi casar D. Miguel com uma irmã do Rei de Nápoles, tão certo estava do restabelecimento do seu Senhor em Portugal. Mas não estava assim optimista o Soberano irmão da escolhida, nem mesmo quisera concorrer para a subsistência de D. Miguel, com 500 ou 600 ducados mensais, segundo os desejos do Rei da Prússia. O Marquês de Lavradio devia ver o Rei de Nápoles no dia 17 de Janeiro de 1838; mas duvidando se devia apresentar-se de uniforme ou de casaca, escreveu ao Ministro dos Negócios Estrangeiro a este respeito, e neste intervalo o Rei adoeceu de maneira que só mais tarde foi recebido por S. Majestade, a tempo de conhecer os desígnios do embaixador [português], pelo que, ora por um pretexto ora por outro, se eximiu de marcar-lhe audiência, até que o Príncipe de Cassario, numa conversa que teve com o Marquês se referiu aos boatos que corriam a respeito da sua vinda a Nápoles, aos quais não presta o menor crédito, e lhe deu a entender que não convinha falar nesse assunto do casamento de Sua Majestade; e foi depois desta entrevista que o Príncipe de Cassario lhe participou a audiência real para o dia 3 de Fevereiro. Não saiu o Marquês de Lavradio porque tendo sido convidado para um baile da Côrte, ali se apresentou, mas apenas entrou nas primeiras salas, e imediatamente se retirou sem procurar entrar onde estava ElRei e a Família Real.

O Marquês de Lavradio vivia atormentado com a marcha dos assuntos políticos e com a saúde da sua filha mais velha, mui atacada de doença de peito. Em dois anos seguidos, 1838 e 1839, foi passar o verão no Porto de Fermo sobre o Adriático, fazendo no primeiro ano uma romaria a Nossa Senhora do Loreto, acompanhando da Viscondessa de Juromenha e seu marido.

(a continuar)

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