24/03/15

A CONTRA-MINA Nº 1: Razão do Título da Obra (I)

CONTRA-MINA
Periódico Moral, e Político,

por

Fr. Fortunato de S. Boaventura,
Monge de Alcobaça.

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Nº 1
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O medonho Fantasma se esvaece,
O dia torna, e a sombra se dissipa;
Os Insectos feíssimos de chofre
Entram no poço do afumado Inferno:
Eternamente a tampa se aferrolha.
No meio do clarão vejo no Trono,
Cercado de esplendor, MIGUEL PRIMEIRO.
(Macedo, Viagem Estática ao Templo da Sabedoria, pág. 141)
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Razão do Título da Obra

O modo de proceder dos Mações foi por largos anos oculto e subterrâneo, e posto que hoje trabalhem mais à cara descoberta é só no momento das suas victórias; pois como refinados Materialista, que todos eles são, e sem a mais leve esperança além desta vida presente, receiam muito, em frase própria deles, comprometer-se. Nestas ideias é que os assassinos de Condeixa mandaram antecipadamente um seu Emissário, para verificar se os desgraçados Lentes, e sua comitiva levariam armas de fogo, que se porventura levassem um só bacamarte, uma só espingarda, por certo que ficaria a empresa adiada para quando não houvesse o tal mais que afrancesado comprometimento. É pois fora de toda a dúvida, que o plano antigo e primordial da Seita, ainda hoje se desempenha, e que um grande número de Sócios e Irmãos trabalhe a coberto de dia, e ainda de noite; e tais conheço eu, que têm feito o seu papel de Realistas magistralmente, e de um modo capaz de enganarem, já se sabe, aqueles, que ignoram os factos anteriores de suas prodigiosas vidas... São estes ainda piores e mais daninhos, que os Mações declarados, ou já sem máscara, nem cobertura, que os defenda, e prosseguindo constantemente em seu primeiro ofício de Pedreiros, Mineiros, ou Sapadores, fazem de dia tais serviços à Causa da Realeza, que mui facilmente se possam voltar contra ela, e destruí-la; e se congratulam de noite pela facilidade, com que os tolos, ou profanos engoliram a peta, e julgaram por sinceros amigos de Realeza, o que tem sido, e hão-de ser até à morte os seus mais encarniçados inimigos. Sendo pois certo e inconcusso, que os Ministros de cá trabalham, e trabalharão incessantemente pelo bom êxito do rebentar da Mina, ou do Mina de lá, que mais bem achado título se pode dar a um novo Periódico do que este de Contra-Mina? Dei a minha satisfação, e já entro na matéria.

Do principal obstáculo a uma Revolução em Portugal, ou do Amor, que os Portugueses têm ao mui Alto e Poderoso Senhor D. MIGUEL I.

Têm notado alguns Políticos, que sendo a Alemanha o principal berço, onde se criam as Seitas modernas, e achando-se os Estados do Imperador da Áustria, como rodeados do incêndio, que muito de propósito se acendeu nas principais Universidades do Reinos vizinhos, assim mesmo aquele Imperador nunca tenha sentido as fúrias revolucionárias, e o desastroso efeito das Sociedades ocultas, que levaram até às bordas do precipício a Monarquia Prussiana. Dá-se comummente uma razão disto, que me parece bem fundada. Estão certos os Vassalos do Imperador da Áustria, que o seu destino, bem longe de melhorar, há-de piorar, e muito, se fizerem uma Revolução; e por isso a boa administração, e os cuidados paternais do Governo afastam dos povos a mínima ideia de se revoltarem contra um Soberano Legítimo, e universalmente considerado mais Pai, que Soberano; assim como refreiam a insolência dos Demagogos, para que não se abalancem a uma empresa temerária, e que forçosamente há-de ser mal sucedida.

mapa de Portugal (1561)
Parece-me que nas mesmas circunstâncias estaria o Povo Português, se nunca tivesse sentido a Revolução de 1820. Lançou esta às mãos cheias tais sementes de corrupção, de imoralidade, e do pior de todos os males, que é o Ateísmo, que desencaminhada uma parte da Nação, tem como levantado neste pequeno território duas Nações mais desavindas entre si, do que foram os Judeus para com os Samaritanos. Onde havia menos Religião, aí se fizeram mais conquistas; e onde só havia uma simples tintura, ou aparência de Religião, bebida em charcos venenosos, como por exemplo na façanhosa, e essencialmente Liberal, ou ímpia Escola dos afamados Pavienses, bastou acenar com a trolha ou mitra, e choveram os adeptos, que viram ser este o caminho mais fácil para os empregos, e distinções, único alvo de certa classe de mercenários, que se chamam abusivamente de Portugueses. Ficou todavia uma parte, e é certamente a maior da Nação, por extraviar, e corromper, nem desceu até às classes mais baixas da Sociedade o contágio das más doutrinas; e o Povo Lusitano (ainda é a muitos respeitos, o mesmo que pôs no Trono o Senhor D. João I, e conservou nele por espaço de 27 anos contra os últimos esforços de uma grande Potência o Senhor D. João IV.) [Fr. Fortunato de S. Boaventura, noutros escritos mostra que não foi o povo que legitimou D. João I e insurge-se contra esta ideia; aqui o "pôs no Trono" significa a força feita pelo povo, contra todas as adversidades, para aclamar activamente aquele a quem o Trono devia ser entregue por todas as legítimas razões, e não por capricho popular.]

(continuação, II parte)

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