15/04/15

OS NOTÁVEIS DESACATOS OCORRIDOS EM PORTUGAL (III)

(continuação da II parte)


Sé do Porto
Aconteceu na Sé da Cidade do Porto (Refere este caso Gabr. Per. de Carv. De Man. Reg. P 2ª Cap. 53 n. 24 fol. 331) em 11 de Maio de 1614. Foi roubado do Sacrário o Sagrado Vaso com as Sagradas Fórmulas. Nunca pôde ser descoberto o executor do delito.

Fez-se por este motivo uma grande Procissão de Penitência de noite, em que foram descalços o Bispo D. Gonçalo de Morais, e o Governador, que então era das Justiças, Diogo Lopes de Sousa 4ª da Relação daquela Cidade (ó tempos, ó costumes). Semelhantes demonstrações de desagravo se fizeram em Lisboa, Coimbra, e por todo o Reino.


Sucedeu em Lisboa, na Freguesia de Santa Engrácia, na noite de 15 de Janeiro de 1630. Foi arrombado o Sacrário, e roubadas as Sagradas Formas de um Cofre de tartaruga guarnecido de prata, e de um Vaso também de prata sobre-dourado; e roubados também alguns ornatos dos Altares.

O réu, que se supôs deste delito, foi sentenciado a ir arrastado pelas ruas públicas até ao lugar, onde cometeu o crime, a serem-lhe ali cortadas as mãos, e queimadas à sua vista; e depois ser ele queimado vivo, e as cinzas lançadas ao mar.

Por este motivo se instituiu uma Irmandade composta de cem Irmãos, da principal Nobreza da Côrte, com o título de Escravos do Santíssimo Sacramento, que costumam fazer todos os anos um Tríduo na Real Capela da Ajuda, e costuma também ElRei assistir à Festa do primeiro, e último dia.


Aconteceu na Igreja da Freguesia do Santíssimo Nome de Jesus de Odivelas, na madrugada do dia 11 de Maio de 1671, tempo da Regência de ElRei D. Pedro II (Refere este caso o Advogado, que foi nomeado para defender o réu, Manuel Alves Pegas, no seu Tratado Histórico, e Jurídico).

Foi arrombado o Sacrário, e foram roubados dois Vasos Sagrados, um de prata sobre-dourada, com as Fórmulas consagradas, e outro de prata lisa. Foram roubadas outras muitas coisas, e ornamentos das Imagens dos Santos, e Altares.

Por Decreto do Príncipe Regente, foi nomeado para Juiz da devassa deste delito o Regedor das Justiças, Conde de Vilar maior, e Escrivães os Desembargadores Diogo Marcão Temudo, Corregedor do Crime da Côrte, e João Leitão de Andrade. Descobriu-se o delinquente, e foi condenado a ser arrastado pelas ruas públicas até à Praça do Rossio, e ali depois de cortadas as mãos em vida, e queimadas à sua vista, morrer de garrote, e seu corpo reduzido a cinzas.

Por este motivo se fizeram muitas demonstrações públicas, e Procissões de Penitência, e Desagravo. A primeira foi desde a Sé até à Freguesia de Santa Engrácia, em que foi o Príncipe Regente, toda a Côrte, o Clero, e todas as Comunidades Religiosas. Seguiram-se Procissões semelhantes em todas as Freguesias de Lisboa, e outros muitos actos públicos de piedade, e Religião.

E 16 de Junho do mesmo ano foram achados casualmente no caminho de Odivelas para Lisboa, no silvado de uma vinha os dois Vasos Sagrados embrulhados num lenço, e um embrulho com muitos dos ornamentos roubados, o que tudo foi levado ao Juiz da devassa.

Fizeram-se novas diligências, tendo-se já feito muitas, e prometido o Príncipe Regente grandes prémios a quem descobrisse o delinquente; mas tudo em vão, até que na noite de 16 de Outubro, sentindo uma criada do Mosteiro de Odivelas andar gente na cerca, pelas dez para as onze horas da noite, deu parte, chamaram-se os Religiosos, e criados do Mosteiro, que fica contíguo ao das Religiosas, entraram na cerca, e encontraram um homem, que declarou ter entrado com intento de furtar galinhas, como já tinha feito mais vezes. Foi preso, e sendo buscado pela Justiça, entre outras coisas que se lhe acharam, foi dentro de uma bolsa com algum dinheiro, uma Cruz de prata dourada, embrulhada num papel, que, sendo reconhecida, achou-se ser aquela, que fôra quebrada do Vaso do Sacrário.

O que tudo sendo levado ao Conde Regedor, e fazendo-se exame judicial da Cruz com o Vaso por dois Ourives, se achou ser a mesma que ali faltava; e por este indício se presumiu ter sido este preso o autor do roubo. Acharam-se depois num embrulho de fato do mesmo réu o resto dos ornamentos roubados, que ainda faltavam; e fazendo-se-lhe perguntas, suposto negou ao princípio, veio por fim a confessa ter sido o autor, e perpetrador daquele roubo, por cuja confissão foi condenado na forma que já se disse.

Em 1744 um devoto, chamado António dos Santos, erigiu um Oratório, em memória deste acontecimento, no sítio onde apareceram os Vasos Sagrados, cujo se chama hoje o Senhor Roubado.


Sucedeu na Vila de Palmela, na Igreja da Freguesia de Nossa Senhora do Castelo, que hoje existe na Ermida de S. João Baptista, extra muros da mesma Vila.

Eis aqui o caso, conforme a conta, que deu o Presidente do Real Convento, e Ordem de Palmela, Clemente Monteiro Bravo, à Rainha Fidelíssima a Senhora D. Maria I:

"Senhora,
na noite de 13 do corrente mês de Maio, dia da Ascensão de Nosso Senhor Jesus Cristo, para o dia 14, a Ermida denominada de S. João Baptista, fronteira a este Convento, e contígua a esta Vila, que há muitos anos serve de Freguesia de Santa Maria, Matriz da mesma; se achou roubada, segundo dizem, por três ladrões, que espoliando-a quase de toda a prata, e alfaias, e por ela difundindo os Santos Óleos, deixando as Âmbulas com as bocas em terra, passaram ao horrendo atentado de abrirem o Sacrário, donde levaram um Cofre com uma Hóstia, e cinco Fórmas consagradas, nele depositadas, e uma Pixide com cento e três Partículas consagradas, deixando além disso muitas dispersas pelo altar do mesmo Sacramento. Peço a V. Majestade a sua Real Resolução, com a brevidade que o caso pede, para a minha última, e acertada determinação. Convento Real de S. Tiago da Espada de Palmela 15 de Maio de 1779.
O Presidente do Real Convento da Ordem de S. Tiago: Clemente Monteiro Bravo."

(continuação, IV parte)

Sem comentários:

TEXTOS ANTERIORES