07/10/15

MEMÓRIAS ECLESIÁSTICAS DO REINO DO ALGARVE (Cap. XV, I parte)

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CAPÍTULO XV

D. Sancho I (Catedral da Guarda)
Antiga Fundação da Praça de Silves: Não Foram os Povos Curetes, Sim os Cynetas, ou Fenícios, Seus Primeiros Habitadores: Breve Narração da Tomada Daquele Castelo Por ElRei D. Sancho I.

A Cidade de Silves, célebre pela riqueza, e comércio de seus antigos habitadores, lastimosa pelas ruínas de seus edifícios, e cidadãos, está situada à parte Ocidental do Reino do Algarve (na versão da Geog. Nubiense ediç. Paris 1619 citada pelo Cl. Gonçalo Xavier de Alcobaça na Diss. da Academ. Liturg. Tom II, pág 527 "huic esiam provinciae limitanea est ab occasu provincia Alfaghar [Algarve] intra cujus ambitum deprehenduntur Sancta maria, Martola, Selves cum plurimis castelis, ac pagis. Jungitur hic provinciae Alacacer, quae nomen a filio Danes, continetque Jaboram, Batalios, Saripam, Maredam, Cantarai, Aljaif & Coriam, etc."), três lugares ao Oeste do antigo Porto de Anibal. Alguns Escritores asseguram ser edificada aquela Praça pelos Povos Curetes (Plobacion Gen. de Esp. pág. 2 ediç. 1675 Corog. Portug. Tom III, pág. 4, D. Luís Caet. de Lima, Geog. Hist. Tom II diz, que Silves se supõe edificada antes da vinda dos Cartagineses. É certo que os Povos chamados Curetes, de quem fala Justino no Liv. XLIX vindos da Grécia às Espanhas, são os Cynetas, Cinésios, ou talvez antes dos Fenícios. Sabemos que os Historiógrafos daqueles tempos lhes dão os nomes, segundo a diversidade das Regiões que habitavam. Os Curetes porém nunca vieram às Espanhas, o que dignamente decidem, e provam com eficazes razões os Cl. PP. Mohedanos na sua Hist. Litt. de Hesp. Tom. II Part. I Liv. IV, pág. 127 e seg. e Tom II Part. II Dis. VIII pág. 71 e seg.), quatrocentos, e quarenta antes da vinda de Cristo. Sobre um monte, a que vai contornando uma pequena planície, se vê elevada esta Cidade. Altas serras encurtam por todos os lados a sua vista, e fazem seu horizonte restrito, e muito apanhado. A diversa disciplina de seus conquistadores a fez confluir de fortes muros, e baluartes, segundo os tempos, e interesses obrigavam. Uma ribeira lava as casas de seu arrabalde, e por isso suas estreitas margens não são estéreis à benigna cultura.

Desemboca esta ribeira na barra de Portimão, por onde lhe entra o fluxo da moré, que sobe até cobrir as mesmas fontes. Foi antigamente famoso este rio pelas enterprezas dos Cartagineses. Romanos, e Sarracenos, como também foi útil ao comércio nacional no princípio do governo dos nossos Soberanos (antigamente eram frequentes entre nós as Assembleias dos Povos dos diversos Estados do Reino, a que chamam Côrtes. Nelas se resolviam as controvérsias, e se ordenavam as decisões, e Leis sobre os pleitos, queixas, e interesses dos mesmos Povos entre si, e da Coroa. A Câmara de Silves abunda nestes Pergaminhos originais das decisões que li, e consta deles os grandes interesses de comércio, que se fazia naquela Cidade até aos anos de 1351 que totalmente foi arruinada; recobrando um pouco o antigo esplendor no fim do século XV e princípio do XVI em que o Senhor Rei. D. Manuel mandou reformar os antigos Forais das Cidades, e Vilas; reduzindo a melhor forma a economia da fazenda; e no Foral de Silves, assinado em 1505 se lê, ser esta Cidade reputada primeiro que a de Lisboa para o privilégio de vizinhança. A decadência do comércio, e as disposições que a Província permite para castigo dos homens, arruinaram Silves, até ao ponto de lhe ser arrancada a glória da Cadeira de Paulo III que depois de alguns anos se verificou governando o Senhor Rei D. Sebastião, apesar das oposições dos moradores, que ainda hoje sentem, e choram esta falta). Um Ilhéu de cem palmos de comprido por vinte de largo divide uma pequena foz (a que chamam a barra de Silves) da serra da atalaia, onde houve uma guarita dos tijolos, ou ladrilhos Fenícios, de que já falei, a qual servia aos Turdetanos, e Sarracenos de vigiarem sobre a entrada do Porto. Bem poucos anos há que se viam nas rochas vizinhas argolões grandes de ferro, e bronze, destinados a se amarrarem as embarcações de maior parte. Os velhos têm insstruido a seus netos haver naquele Ilheu um registo, onde antigamente davam entrada, e saída às embarcações, que parece ficavam ali em franquia (sabemos por uma Lei do Senhor Rei. D. João II, passada em Évora aos 23 dias de Janeiro de 1495, que este Soberano para adiantar o comércio daquele País deu uns grandes privilégios, e isenções a doze Pescadores nacionais, que se estabelecessem no lugar da Amixolhoeira da Carregação, termo da Cidade de Silves, por ser o sítio daquela Povoação mais acomodado à transformação, e saída dos géneros daquele terreno, e o da Pesca. Guarda-se este Pergaminho na Câmara de Silves, do qual extraí uma cópia).

Sofreram os moradores de Silves as mesmas mudanças de costumes, ritos, e dominadores, como o mais resto dos Povos da Lusitânia. os bárbaros Sarracenos da família dos Almoadas tinham o senhorio das Espanhas, o célebre Abderrame Mouro honrado, e valoroso passou naqueles dias da África com grande poder de soldados; e internado na Lusitânia, tomou Beja, Évora, Santarém, Lisboa, e todo o Algarve (nisto viu um mouro honrado a Espanha: e pelejou com Juffez, e matou-o, e fez-se Rei, esse Abderame veio dalém mar com grande poder de gentes de  Miramulim, e depois que matou Juffez senhoreou-se de toda a Espanha. E tomou os lugares que ficavam por tomar aos Cristãos: este destruiu as Igrejas, e queimou os Santos que estavam nelas, etc. "São palavras originais de um raríssimo Mss. que se conserva entre os Livros do Sábio Professor de Filosofia bento José de Sousa Farinha, a pág. 72 e é uma Crónica das coisas daqueles tempos, descoberto este Mss. na Cidade de Évora." Tem lembrado ser a Tradução de Rafis, por Mahamet, e Gil Peres, ou outra Crónica das mais antigas, ou a Tradução que fez Resende, como já disse). Segundo alguns Escritores, Silves foi tomada aos Mouros por ElRei D. Fernando o Grande de Castela em 1060 cuja possessão logrou poucos tempos (Corograf. Portug. Tom III pág. 4 D. Luís Caet. de Lima Geog. Hist. Tom. II). Com Ismar, e os demais reis, que foram vencidos na batalha do Campo de Ourique, também se sabe que viera o Potentado de Silves, homem de grandes forças, e agigantada estatura, a quem ElRei D. Afonso Henriques matou naquela famosa victoria com uma lançada (Mr. de la Clede Hist. de Portugal).

(continuação, II parte)

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