07/01/16

VOCABULÁRIO DEMOCRÁTICO Nº4 (VIII)

(continuação da VII parte)

Um Empréstimo feito pela maneira, com que agora se fez, e que já há muito se podia ter feito, é o mais sensato, o mais útil, e o mais político. Por isso mesmo que a endiabrada perfídia maçónica persiste em desacreditar todos os actos do Governo do melhor dos Reis, é por isso que nós insistimos em mostrar as proposições já indicadas. A saber:

1.ª
É sensato

E prova-se. Chama-se sensato tudo aquilo, que se faz com juízo prudencial, e conforme ao senso comum; ora o Empréstimo, de que se trata, é feito com juízo prudencial, e conforme ao senso comum; logo, etc. Que é feito com juízo, e muito juízo é tão claro como é certo que ElRei abriu um Empréstimo há mais de seis meses, em que admitia a metade  em Títulos os Recibos, que os Cambistas compraram o mais caro a 25 por 100, dando hipotecas mui seguras, e o juro de 6 por 100; e apesar de tudo a nada se moveram os Brutos milionários; deram mais uma volta à fechadura da burra, e o Empréstimo não se encheu: neste caso então foi mui judicioso, e prudente obrigar estes ambiciosos sicofantas a que entrassem com dinheiro corrente, vencendo só 5 por 100, e sem hipoteca, porque um Estado não é um particular, que se mude aos seis meses, e que hoje está em Lisboa, amanhã no Paquete: e também é conforme ao senso comum, porque este nos diz, e a experiência universal no-lo confirma,  que a salvação do Estado não tem Lei, ela mesma é que forma a Lei: Salus populi suprema lex esto: é por isso que em casos de apuro até as pratas da Igrejas se fundem para cunhar dinheiro: assim o fez D. João II, e nem por isso deixou de ser um grande Rei: e então porque há de ser privilegiado o dinheiro de um, que nasceu pobre, e que agora conta milhões ganhados com o Estado, ou á sombra dele?! É mui conforme ao senso comum este procedimento, e tanto o é que todos o aprovam, à exceção dos Pedreiros; é além disso feito com muito juízo; logo é sensato. Livrem-se lá se são capazes de silogismo.
 
2.ª
É útil

E Prova-se. Chama-se útil em política toda aquela disposição do Governo, que redunda em proveito de muitos, ainda que seja com sacrifício de alguns. E estará por ventura neste caso o Empréstimo? Quem o duvida? São mais três milhões, que vão entrar em giro, e principalmente caindo em mão de Soldado! Interessa a casa de venda, a taberna, valem mais os géneros, onde persiste a Tropa, e até parece que a Providência descobriu este meio para compensar os incómodos, que faz sofrer aos Povos: interessam milhares de pessoas com esses milhões que aferrolhados com as arcas dos ricos de nada serviam: e quem são os lesados? São bem poucos, e se acaso são muitos, são lesados em pouco. O que é 48 contos para quem conta 28 milhões? Que falta lhes pôde fazer quando para outras empresas se davam contos sem conta, e sem juro?! Isso não é nada: é mais bizarria dar uma lavandeira um vintém, como apareceu em Gazetas, do que qualquer milionário dar meio milhão; logo claro fica que é útil. O que lhe há de amargar mais é a proposição [...?]

3.ª
É político.

A isto gritaram os tais sujeitos "leve o diabo semelhante política." Agora sim, quando Vossas Mercês assim falam, é que nós estamos contentes, e por isso repetimos, é político, e mui político, e não o duvideis. Um ricaço endinheirado, que não gosta do Governo, e que não está com ele envolvido em dívidas, é naturalmente seu inimigo; e ainda que não conspire de facto, a sua mesma indiferença e apatia é nociva; mas se este homem tiver contas com o Governo, e este lhe seja devedor de grandes quantias, e a segurança da sua dívida estiver pendente da segurança do Estado; este homem pela sua mesma ambição é desde logo um amigo necessário do Governo; e ainda que muitas vezes professe ideias contrárias há-de obrar em sentido inverso para ter segura a sua fazenda. Bem haja S. Majestade que por este modo os comprometeu: eles esperavam que nestes apertos não houvesse um vintém para mexer um Soldado; mas como veem que tem havido, e há de haver milhões, e que estes lhe hão de sair das algibeiras; dizem agora "para que é tanta Tropa! tanto Soldado!" E pela boca pequena acrescentam "e à nossa custa?!" e algumas ainda acrescentam mais "irra! arder em dois fogos?! Ora eis-los aqui comprometidos: assim, assim: há mais tempo que eles deviam ter esta peia: não haviam ter espinotado tanto... A estes, que assim falam, damos dois conselhos: 1.º vejam com imparcialidade a maneira, com que em nome do Sr. D. Pedro se fazem os empréstimos na Ilha de S. Miguel (é horroroso este procedimento.); 2.º suspendam as mesadas e correspondências, que têm sustentado, com quem não devem, e então faltos de socorros desesperaram da empresa invasora, e Portugal livre dela não precisará de empréstimos desta natureza.

Terminaremos este Artigo por dizer: os que se não querem comprometer, é porque já estão comprometidos, e já se sabe com o partido rebelde; porque quem segue uma Causa boa não tem dúvida em o manifestar; e a melhor política para com esta gente é comprometê-los a todo o custo, e fazê-los amigos necessários.) D. Tr.


LISBOA:
NA IMPRESSÃO RÉGIA. ano 1831.
Com Licença.

(Fim do Nº4)
(o nº5, aqui)

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