05/07/16

CONTRA-MINA Nº 40: A Estátua da Fé (b)

(continuação da parte a)

Não era pois, não era inútil uma Instituição, que apesar de a terem sopeado, e maneatado por mil diferentes meios, dava ainda de tempos a tempos uns sinais da vida, que punham em derrota as mais bem, ordenadas falanges do Maçonismo. Bem sábio é o caso do Lente de Matemática José Anastácio da Cunha, que fazendo-se intérprete da Natureza, ou antes do Inferno, arrastou consigo para os cárceres do Santo Ofício de Coimbra não poucos dos seus adeptos; e se a Inquisição nesses dias pudesse o mesmo, que já pôde nos saudosos do Senhor D. João III não poderia hoje [ele] nada em Portugal, donde seria expulso para nunca mais reverdecer o fatal, e pernicioso Maçonismo... Não era inútil uma Instituição, que empecia os vôos ao Pedreiro Hipólito José Costa, que lhe cortava as asas, e o reduzia à extremidade de nos dizer um eterno adeus. Enfim não era inútil uma Instituição, que metia respeito, e enfrentava as línguas dos blasfemadores, isto é, dos Pedreiros Livres, e que era como a salva-guarda, e o Anjo tutelar de boa administração do Sacramento da Penitência, em que os Sacerdotes Ateus, e Pedreiros têm feito, desde a extinção do Santo Ofício, os mais horríveis ensaios de perversidade, arrastando dali mesmo para os altares de Moloch as próprias vítimas, que eram destinadas para se banquetearem com o pão dos Anjos!!

Ora os Pedreiros Livres querem, e ansiosamente desejam, que tudo isto aconteça, e que por estes, como degraus, vá trepando a Seita, e se coloque afinal no próprio Trono da sua competidora, e inimiga implacável a Santa Religião Católica, Apostólica Romana, e por isso estremecem, e por isso estremecem, caiem demasiados por terra, depois de suores frios, imagens da morte, quando se lhes representa verem outra vez no seu devido lugar a Estátua da Fé.... Atrás dela poderá vir, o que mais tememos... eis-aqui o grito, que milhares de vezes se tem ouvido nas reuniões nocturnas, e que até já se ouviu em alto dia; eis aqui o mais forte dos obstáculos, para que se realizem os votos, e humildes súplicas de todos os bons Portugueses! E Porque uma legião de Portugueses bastardos não quer nem sombras de Inquisição, porque também não quer em Portugal nem sombras de Catolicismo, hão de ser os bons, ou a grande maioria contrariada perpetuadamente em seus mais ardentes votos, em seus mais puros desejos? Dar-se-há caso, que fiquemos de rastos na opinião dos Estrangeiros, só por levantarmos a Estátua da Fé? Ditosa ignomínia seria esta, que em certo modo nos igualava com os Santos Apóstolos, que eram taxados de loucos por amor de Jesus Cristo. Se há Nações Europeias, que tenham a Fé pela última coisa, e que não curem de outros interesses, que não sejam os deste mundo, nós os Portugueses temos outras ideias, outro Moral, e outras esperanças. Pela Fé se imortalizaram os nossos Maiores, podendo afirmar-se com toda a certeza, que pela Fé venceram muitos Reinos, e obtiveram o complemento das infalíveis promessas do Campo de Ourique. Por certo que este Reino deveu muito mais à voz dos seus Prégadores, do que à espada dos seus Generais... As conquistas de S. Francisco Xavier foram mais ilustres, que as do grande Afonso de Albuquerque; e mais puderam as lágrimas, e vozes de um Anchieta, e de um Vieira no novo Mundo, que os heroísmo de um Estácio, ou de um Mendo de Sá, ou de um André Vidal de Negreiros, ou de um João Fernandes Vieira - Pela Fé se aldearam os Índios errantes; pela Fé reconheciam por Soberano o Rei de Portugal; pela Fé, como que se tornavam homens, os que até esse tempo eram bravas, e indómitas feras... E não deveremos ser agradecidos à Fé quanto nos importa? Não desejaremos ver a Estátua da Fé, como se fosse uma Princesa, que virando o rosto para o Tejo, ou para o novo Jordão, que somente o antigo, e verdadeiro é mais abundante de prodígios, o abençoe, por ser o lugar donde partiram tantas, e tão felizmente sucedidas Expedições Evangélicas... E seremos constantemente as vítimas do influxo Pedreiral, que sonha futuros horríveis... (Oxalá que os visse quanto antes verificados!) e por tímidas contemplações, que só devem aumentar, e fazer subir de ponto a desmesurada insolência dos Liberais da Europa, careceremos do que mais nos agrada, e também do que mais nos conforta? Foi só para se fazerem beneméritos, e bem quistos daquela raça precursora do Anti-Cristo, raça infame, perverso, e maldita, que os Pedreiros Livres deste Reino abateram a Estátua da Fé; nem eles queriam ver à frente da Lapidada Constitucional a mais viva repreensão deste novo, e propriamente Babélico Edifício, que principiado em outra que tal vertigem, devia ter aquele fim, de que os bons tanto se aplaudiram, e gloriam. Eu fui testemunha ocular desta famosa demolição; vi com toda a complacência da minha alma, vi cair umas após outras as grossas pedras desta segunda Babel, que nem depois de nivelada com o chão satisfaz a raivosa impaciência dos seus destruidores, que não perdoaram, nem sequer ao próprios alicerces. Foi esta a primeira indemnização dos tratamentos, que se fizeram à Estátua da Fé... Tudo quanto se fez nesta memorável ocasião foi decretado nas lojas, tudo se fez debaixo de ordem, que por ela é que assistiram as Músicas dos Regimentos, para solenizarem a queda, e os vilipêndios da Fé... porém agora quando foi desfeito, e bem desfeito o Monumento Constitucional, foi tudo, tudo espontâneo, foi a verdadeira expressão da vontade geral... Pudessem então mesmo acudir-lhe certos heróis, que rodeavam o Trono! Porém seria um excessivamente rápido, e mui perigoso desfecho da Tragi-comédia de Vila Franca... Dêmos graças a Deus, que eles não tivessem pelo menos desfigurado a Estátua da Fé, para que nunca mais tornasse a servir, assim como fizeram aos Cárceres de várias Inquisições deste Reino; porém não cessemos de endereçar os nossos votos ao mesmo Deus, e à sua Imagem neste Reino, para que se levante de maneira triunfal, e que nunca mais se apague na memória dos vindouros a exaltação da Estátua da Fé... Nunca serão tidos na conta de ociosos, ou maus tais desejos senão por algum Pedreiro Livre; e tal censura deve ser um motivo cada vez mais forte, para se aumentarem, e para tomarem cada vez mais vulto, e consistência os nossos desejos... Por certo, que não são eles ofensivos nem da Majestade Divina, nem da Majestade humana... Quem estará mais persuadido em toda a Europa, do que o mui Alto e Poderoso Senhor D. MIGUEL I, que toda a capitulação, ou tréguas com Pedreiros Livres, é sempre fatal aos Reis? Não tem ele um exemplo doméstico o mais bem achado para o intento, e o mais persuasivo?... Que tirou o Senhor D. João VI de fazer certas vontades aos Pedreiros Livres? Armá-los de um ódio irreconciliável à sua Pessoa, porque lhes não fez quanto eles queriam, e apressar talvez a sua morte.... Os Pedreiros Livres nunca se limitam pouco, anelam a mais, e mais; querendo tudo, e ainda prosseguem firmes na sua primeira tenção. Daqui vem certo empenho, ou afinco o mais esturrado, sem que a despeito de todas as considerações, e até das mais vulgares decências, ainda se conserva em pé muita coisa, de que já não deviam aparecer nem fumos; pois deveria ter caído nos princípios de Junho de 1823. Assim mesmo existe uma barreira invencível contra eles.... É a nossa Fé, e daqui vem o nosso enternecido afecto ou apego à Estátua da Fé.... Tudo quando vemos, e mal podemos ver sem lágrimas de um vivíssimo prazer, é efeito, é obra directa, é obra imediata da Fé... A chamada Fé política era um laço mui débil, e mui quebradiço só para vincular os Portugueses com o seu Soberano, se porventura lhes faltasse a outra, quero dizer, a Fé Católica... É esta, e só esta, a que faz voar de uma a outra extremidade do Reino as Tropas de segunda Linha, e as tem feito romper através de imensas dificuldades, para mostrarem ao seu Rei que o adoram, e que o adoram como seu especial defensor, e protector contra a irrumpão dos Pedreiros Livres, que provocados, e desafiados pelos de cá, se têm preparado para nos invadirem, .. e para acabarem de todo com a Santa Religião dos nossos Maiores.. É bem para admirar a insensibilidade de homens rudes, e agressivos às mias duras, e cruéis privações, que todas se põem de parte, e sã como se nem sequer existissem, apenas se dá um Viva ao Senhor D. MIGUEL I. Este adorado Nome, que parece vencer toda a fúria dos elementos, para que o Voluntário Realista, e o Miliciano encharcado em água, sem fio enxuto, e pode ser que morrendo de fome, sinta cada vez mais amor à Sua Real Pessoa, e cada vez mais empenho de verter o sangue todo em obséquio do melhor dos Reis; este adorado Nome, que tem a força de quebrar os mais fortes laços de famílias, e de condenar aos mais grandes prejuízos, e como que se faz superior às vozes da natureza, e do interesse mais justo, e razoável; este Nome finalmente donde recebeu estas desmedidas forças, senão da Fé? E os bons Portugueses, que o estavam vendo, presenciando, e aplaudindo, serão talvez criminosos, porque desejam ver arvorada a Estátua da Fé? - Antes pelo contrário, no próprio lance, em que mais se declaram neste Reino as maravilhas da Fé, lembram-se da melhor de todas as recompensas para um verdadeiro Português, que é, ver testemunhos públicos, donde se mostre, (e deverá mostrar-se todos os dias) o que este Reino é devedor à Fé. Se tivessem conseguido tirá-la aos Portugueses, quem reinaria hoje em Portugal? Não era por certo o mui Alto e Poderoso Senhor D. MIGUEL I, que por isso tem, e deve ter a Fé, como principal esteio do seu Trono, assim como o é das esperanças de todos os verdadeiros Portugueses, em cujo número se conta

Desterro 13 de Dezembro de 1831

Fr. Fortunato de S. Boaventura

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