21/03/17

HARMONIA POLÍTICA DOS DOCUMENTOS DIVINOS - Ao Príncipe

AO PRÍNCIPE NOSSO SENHOR
 
Sereníssimo Príncipe

O zêlo de servir a Vossa Alteza Real copiou esta Política do exemplar Divino: o governo dos Senhores Reis Portugueses se ofereceu logo Harmonia, e demonstração de sua verdade; e cuidava eu que inculcaria a V. A. Real um feliz estudo nas acções dos Monarcas seus avós, que nem podem ser imitadas senão por um Herói, nem pode haver Heróis sem que as imite; pelo que V. A. se dignaria de tais Mestres, e eles se gloriariam de tal Discípulo. Mas já quando lhe apresentei esta obra manuscrita, sabia V. A. Real da infância quanto se aprende na idade perfeita: parecendo que inventara, não que estudara esta ciência; e assim o que eu dedicava a Instrução, ficou sendo retrato de V. A. Se todos os Príncipes tivessem a boa fortuna de ver o Original, fora supérflua esta pintura: mas onde o sol não pode chegar, é necessário que se acendam tochas; permita V. A. R. que os ausentes aprendam desta impressão o que os presentes aprendem de sua vista; e veja-se que seu glorioso pai segura felicidades a este Reino também para depois de si: preparando um herdeiro a quem tão perfeitamente instruiu, e que tão perfeitamente o imita. Se V. A. fora dotado de menos modéstia, e eu tivera mais eloquência, mostrara este livro com particularidade no acerto de suas acções o infalível desta Política; mas, porque me fora tão difícil relata-las, como a V. A. Real permitir-mo, justifico minha omissão com seu gosto: e quero esta vez escrever antes com lisonja, que com Justiça. Guardo-a somente em dedicar este meu trabalho ao entendimento, não à fortuna de V. A. Real: pois, ainda que em sua pessoa Sereníssima seja tudo objecto de veneração, mais podem suas virtudes que sua grandeza. Não escreveu só por lição, ou só por experiência: mas juntamente pelo que li e pelo que experimentei; nas  embaixadas que tive a meu cargo vi e pratiquei os negócios mais graves que em Europa se ofereceram nestes onze anos depois da Restituição de Sua Majestade a sua Coroa; anos mais notáveis que muitos séculos. Se com tudo (como reconheço) estes escritos não têm outro preço senão do assunto, a que a pena pior cortada não poderá deslustrar, ainda assim merece que V. A. lhes ponha os olhos; e eu tivera por glória trabalhar toda a minha vida, por lhe agradar um só momento. A de V. A. Real guarde Deus, para bem da Religião: aumento de Portugal: crédito de sua fama; que será inveja, e admiração a todos os Príncipes

António de Sousa Macedo.

(a continuar)

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